Resenha de CD e DVD
Título:Multishow ao vivo-Ivete Sangalo 20 anos
Artista: Ivete Sangalo
Gravadora:Universal Music
Cotação:* * * 1/2
Título:Multishow ao vivo-Ivete Sangalo 20 anos
Artista: Ivete Sangalo
Gravadora:Universal Music
Cotação:* * * 1/2
"O nosso show nunca acaba", contemporiza Ivete Sangalo para o público que encheu a Arena Fonte Nova, em Salvador (BA), na noite de 14 de dezembro de 2013, para assistir à gravação ao vivo do show comemorativo dos 20 anos de carreira da cantora baiana. Dita ao fim da apresentação, encerrada com diluidora abordagem da canção Careless whisper (George Michael e Andrew Ridgeley, 1984), hit do duo britânico Wham!, a frase diz muito sobre a natureza festiva da música e da carreira fonográfica de Ivete. Cantora que sempre abriu mão de conceitos em favor de um repertório populista, concebido para fazer rolar a festa, Ivete surpreende positivamente nesta gravação ao vivo, editada em CD, em DVD simples e em DVD duplo (formato que reproduz o show completo, com as 43 músicas do roteiro condensadas em 30 números musicais). Multishow ao vivo - Ivete Sangalo 20 anosé o melhor registro de show da estrela da música rotulada como axé music - gênero, aliás, que nem sempre se ajusta a um repertório pop que inclui até samba em clima de gafieira - Me engana que eu gosto (Gigi, Radamés Venâncio e Ivete Sangalo), uma das inéditas do roteiro, gravada em dueto expansivo com o cantor mineiro Alexandre Pires - entre reggaes e românticas baladas como a resignada Só num sonho (Ivete Sangalo, Radamés Venâncio e Gigi, 2012). Tanto do ponto vista técnico quanto musical, o DVD faz jus à importância da artista no mercado musical brasileiro. Feita sob a direção de Nick Wichham, a primorosa filmagem consegue captar a grandiosidade da produção sem distanciar a cantora do espectador que vê o show pela tela da TV. Diferentemente do megalomaníaco Multishow ao vivo - Ivete Sangalo no Madison Square Garden (Universal Music, 2010), pontuado por momentos e figurinos bizarros, o espetáculo dos 20 anos tem mais foco, mais coerência com a trajetória seguida por Ivete nessas duas décadas de carreira - período que abarca também os anos vividos como vocalista da Banda Eva - e está mais em sintonia com a personalidade carismática de Ivete (inclusive nos figurinos, adequados). Com habilidade, o roteiro entrelaça os hits inevitáveis - como Festa (Anderson Cunha, 2001), Sorte grande (Lourenço, 2003) e Flor do reggae (Ivete Sangalo, Gigi e Fabinho O'Brian, 2004) - com inéditas e covers de sucessos alheios. Pautada pela diversidade rítmica que norteia o repertório de Ivete nos últimos dez anos, a safra de inéditas inclui como de hábito axés moldados para micaretas e trios - casos da agalopada Obediente (Adson Rocha, Sergio Rocha e Zeca Brasileiro) e de Pra frente, composição de Gigi, Magno Sant'Anna e Filipe Scandurras, o mesmo trio que compôs a vibrante Tempo de alegria, música lançada de forma avulsa em novembro de 2013. Embora realmente feito em tempo de alegria, há espaço até para um tema que esboça atmosfera de romantismo vintage, Beijos de hortelã (Liah Soares), de gosto ideal para o público pouco exigente da artista. Mais voltada para as raízes da música afro-pop-baiana, Ivete também se banha - sem efetivamente se molhar muito - na praia do reggae com canções levadas na cadência do ritmo jamaicano, como Amor que não sai (Gigi e Dan Kambaiah) e Pra você (Ivete Sangalo e Gigi). Gravada por Ivete em dueto com Bell Marques, cantor baiano recém-saído do posto de vocalista da banda Chiclete com Banana, Pra vocêé exemplo da arquitetura simplória do cancioneiro autoral de Ivete, construído sobre bases pouco sólidas, mas que cai bem na voz e no show da cantora. E por falar em reggae, o rei Bob Marley (1945 - 1981) é celebrado pelas regravações de Could you be loved (Bob Marley, 1980) - feita com Ivete em insosso dueto com Alexandre Carlo, vocalista da banda brasiliense Natiruts - e Master blaster (Jammin), música de 1980, composta e lançada pelo norte-americano Stevie Wonder em tributo a Marley. Ivete canta melhor em português. E por falar nisso e em lendas do soul dos EUA, Ivete embarca com Saulo Fernandes em registro sem alma de Cruisin' (Smokey Robinson e Marvin Tarplin, 1979), obra-prima do cantor norte-americano Smokey Robinson. Em contrapartida, a cantora cai apoteótica no samba-reggae. A lembrança de Adeus, bye, bye (Jucy Pinta, Chico Santana e Guiguio) - sucesso do primeiro álbum da Banda Eva - é momento iluminado da festa dos 20 anos. O figurino de baiana e a projeção de igreja no monumental telão de LED, nesse número, mostra que - a despeito de todo o preconceito - a música rotulada como axé music também tem momentos sagrados. O que justifica a gratidão de Muito obrigado, axé (Carlinhos Brown, 2009), expressada no mesmo cenário e no mesmo clima por Ivete. Ainda nesse clima de raiz, os tambores ressoam fortes como a animação da cantora no majestoso medley que junta Faraó, divindade do Egito (Luciano Gomes, 1987), Ladeira do Pelô (Betão, 1987) e Doce obsessão (Cabral e Carlinhos Dias, 1992), sucesso da melhor fase da banda baiana Cheiro de Amor (a da vocalista Márcia Freire). Introduzida por performance do Stomp!, o grupo inglês que tira sons percussivos de pés, baldes e vassouras, No meio do povão (Rubem Tavares e Jorginho, 2012) reitera o fato de, em cena, Ivete jogar o tempo todo para sua galera. Festa de sons, luzes e cores, a boa gravação ao vivo eternizada no DVD Multishow ao vivo - Ivete Sangalo 20 anos é retrato fiel de uma bem-sucedida artista de 42 anos ainda em pleno domínio da voz - bela e afinada, o que não impede algumas interpretações mais largadas - e do carisma que sempre impulsionou sua carreira. Se você é fã de Ivete Sangalo, pode entrar que a festa exibida nesse DVD é sua...