Resenha de CD
Título:Tudo
Artista: Bebel Gilberto
Gravadora: Sony Music
Cotação: * * *
Título:Tudo
Artista: Bebel Gilberto
Gravadora: Sony Music
Cotação: * * *
"Ah, tudo azul...", suspira Bebel Gilberto, em português do Brasil, ao fim dos versos em francês de Tout est bleu (1993), primeiro sucesso do grupo francês de electro-pop âme strong S.A. - chanson solar ora reciclada pela cantora e compositora norte-americana (de criação brasileira) em seu sexto álbum, Tudo, o quinto gravado em estúdio. Com lançamento mundial orquestrado pela gravadora Sony Music para a segunda quinzena deste mês de agosto de 2014, o disco é o trabalho mais romântico da artista, soando até conceitual ao alinhar 13 músicas que, em sua quase totalidade, versam sobre o amor sob ótica positiva, sem peso, sem drama. Tudoé título decisivo na trajetória da artista, que nunca lançou um disco que superasse - ou ao menos roçasse... - o retumbante êxito de sua estreia no mercado fonográfico internacional, feita há 14 anos com Tanto tempo (Ziriguiboom, 2000), álbum em que, guiada pelo produtor Suba (1961 - 1999), a cantora repaginou a Bossa Nova em receita já copiada à exaustão. Tudoé disco gravado por Bebel com produção antenada de Mario Caldato Jr. e com interferências - na capa e também na seleção do repertório - sugeridas por uma gravadora multinacional, a Sony Music, que ainda sabe fazer valer seu poder de decisão no mercado fonográfico. E o fato é que o disco resulta com potencial comercial sem macular a discografia da artista, que vem de álbum de estúdio que não justificou o investimento da Verve Records (All in one, 2009) e de registro ao vivo de show que tinha tudo para acontecer no mercado fonográfico internacional - Bebel Gilberto in Rio (Biscoito Fino, 2013) - mas que acabou aprisionado no mercado brasileiro. Nesse clima de tudo ou nada, Tudo se revela um disco que fala de amor, estrelas, mar e luar em várias línguas - português, inglês e francês - e em tom pop contemporâneo, com doses bem calculadas de bossa e eletrônica. Dentro desse conceito, a regravação bilíngue de Vivo sonhando (Antonio Carlos Jobim, 1963) em clima de sambossa se afina com o espírito do disco tanto na parte em português como nos versos em inglês da segunda metade da faixa. Destaque da atual (desigual) safra autoral da compositora, a balada Somewhere else já anuncia com cordas, na abertura do disco, a atmosfera quase clássica que envolve o apaixonado álbum. Essa atmosfera permeia também outra sagaz lembrança de repertório alheio, Harvest moon (1992), música do compositor canadense Neil Young que virou balada classuda no toque de Bebel. A artista, aliás, normalmente foge do óbvio quando aborda temas alheios. Em contrapartida, como compositora, Bebel continua resultando bem irregular - como reitera Nada não, tema que contraria o negativismo do título com a determinação de versos como "Não vou calar / Não vou mudar / Não quero saber se é isso, aquilo, não, não, não quero não" - e tampouco se impõe como intérprete. Contudo, Bebel abre salutares parcerias no álbum que valorizam o conjunto da obra. Com o compositor e violonista baiano Cezar Mendes, Bebel compôs Tom de voz, canção pautada por tempo de delicadeza sensual. O mesmo que rege a canção-bossa contemporânea que dá título ao disco e que é conduzida pelo violão, Tudo, primeira parceria de Bebel com a gaúcha Adriana Calcanhotto, coautora da letra que versa sobre lembranças amorosas de madrugada acesa. Com o carioca Seu Jorge, Bebel assina e canta um samba, Novas ideias, que rompe com o padrão romântico do disco. A letra é ode à luz da inspiração, inclusive a musical. "Cantar e não saber às vezes / quem escreveu a canção / Mas fica sempre a mensagem / Dessas novas ideias", sublinham Bebel e Jorge numa das faixas mais populares de Tudo. Recorrente, o tom romântico e solar do disco é ressaltado por outra oportuna releitura, a de Saudade vem correndo (1963), samba-canção feito pelo compositor e violonista carioca Luiz Bonfá (1922 - 2001) em parceria com a cantora e compositora mineira Maria Helena Toledo (1937 - 2010). Em si menos envolvente, a canção em inglês Lonely in my heart cativa pelo arranjo vocal enquanto Inspiração sobressai mais pelo clima viajante do arranjo eletrônico. Já Areia - gravada com o violão de Pedro Baby - evoca na introdução a atmosfera de afro-samba, mas deságua na mesma praia do CD. A letra parece de canção praieira. No fim, It's all over now arremata disco que, mesmo sem impressionar, tem cacife para dar novo fôlego à carreira internacional de Bebel Gilberto. Agora é Tudo ou nada...