Resenha de CD
Título: Rock'n'roll sugar darling
Artista: Thiago Pethit
Gravadora:Edição independente do artista
Cotação: * * * * *
Título: Rock'n'roll sugar darling
Artista: Thiago Pethit
Gravadora:Edição independente do artista
Cotação: * * * * *
Há dois anos, Thiago Pethit ascendeu na cena indie brasileira com um grande segundo álbum, Estrela decadente(Independente, 2012), que aguçou a dor contida na música de seu cabaré roqueiro, rompendo com a estética pop folk que pautou o primeiro bom álbum do artista, Berlim, Texas (Independente, 2010). Decorridos mais dois anos, a estrela do jovem cantor, compositor e músico paulistano se ilumina ainda mais ao seguir a trilha marginal pavimentada por Pethit em seu terceiro álbum, Rock'n'roll sugar darling, programado para chegar ao mercado fonográfico na primeira quinzena de novembro de 2014. Neste disco de conceito e acabamento perfeitos, Pethit concilia a pegada e as guitarras do rock'n'roll mais visceral com programações eletrônicas pilotadas por Adriano Cintra, produtor do álbum ao lado de Kassin. Rock'n'roll sugar darlingé álbum movido a sexo masculino. Doses cavalares de testosterona turbinam as dez músicas do repertório inteiramente inédito e autoral, formado por rocks e baladas que aproximam David Lynch do grupo pré-punk The Stooges através da chama pioneiro acendida por Elvis Presley (1935 - 1977). Ambientado em trilha underground que sugere climas e tramas de amor marginal, como mostrado no roteiro road-movie seguido pelo clipe da bela balada Romeo (Thiago Pethit e Hélio Flanders), Rock'n'roll sugar darling é disco quente, cheio de energia até nos momentos mais calmos. Em essência, o álbum é um convite ao extravasamento dos sentidos na noite escura - convite feito de forma explícita em 1992 (Thiago Pethit), faixa de tons sessentistas e clima noir. "Faz do escuro o seu lugar seguro", propõe Pethit. Dando voz a músicas que misturam versos em português e em inglês, Pethit encarna no álbum o voluptuoso anjo sujo de que o ator norte-americano Joe Dallesandro fala no texto que introduz as dez músicas de Rock'n'roll sugar darling. Essa personificação do anjo transgressor dá sentido e coesão ao disco. Contudo, Rock'n'roll sugar darling escapa da armadilha de ser disco em que conceito e sonoridade se sobrepõem à música em si porque o repertório é inspirado, reiterando o talento de Pethit como compositor, já evidenciado no álbum anterior Estrela decadente. Rock'n'roll sugar darling jamais perde o pique. Aliás, é difícil não se render à beleza melódica da música final, Story in blue (Thiago Pethit), balada que remete ao doo wop dos anos 1950 - como se fosse prima-irmã de Haunted love, canção de Estrela decadente - e que embute o poema Ain't got no desire, de Kim Dallesandro (mulher de Joe). Story in blue fala de um último beijo. É a cartada final de jogo de amor que não tem ganhador, como conclui verso de Perdedor (Thiago Pethit), outra bonita balada, de tom mais ameno, encorpada com coro que evoca a música gospel norte-americana. Por transitarem na mesma via marginal que conduz Rock'n'roll sugar darling a um destino glorioso, as baladas do disco se afinam com o espírito sexual do repertório, mais explicitado nos rocks endiabrados. "Doce como açúcar explode na sua boca / Vem chupar meu rock'n'roll", convida Pethit, oferecido e libidinoso, na música-título Rock'n'rol sugar darling (Thiago Pethit). Cantada em inglês, mas com refrão em português, Quero ser seu cão (Thiago Pethit) refaz o convite com referência explícita a um hino do grupo The Stooges, I wanna be your dog (Dave Alexander, Ron Asheton, Scott Asheton e Iggy Pop, 1969). Já Save the last dance (Thiago Pethit) se joga na pista com dose alta de eletrônica, invertendo a ordem linguística do rock anterior (a música é cantada em português, mas o refrão é em inglês). Faixa curta (de menos de um minuto e meio), De trago em trago (Thiago Pethit) adensa clima de decadência amorosa, em que o lamento de Pethit é sublinhado pelo toque da guitarra western de Pedro Penna. Voodoo (Thiago Pethit) começa em tom sagrado, com coro à moda gospel, mas cai na batida clássica do rock. O mesmo rock que ressurge vintage, sujo, em Honey bi (Thiago Pethit e Adriano Cintra), tema que combina o seminal rock'n'roll dos anos 1950 com a crueza punk dos Stooges. "Se você quer meu mel, se esqueça de ir para o céu", avisa Pethit em verso de Honey bi. Sim, na estrada pavimentada por Pethit à margem do mercado fonográfico, todas as trilhas conduzem a um universo outsider em que o gozo do candy rock do artista parece residir justamente na profanação dos dogmas. Mas é nesse caminho - iniciado a rigor no já iluminado Estrela decadente - que Pethit ascende e galga altos degraus ao apresentar um dos melhores discos brasileiros de 2014. Chupe o seu rock'n'roll!